Sexta-feira, 04 Julho 2025

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“Gastronomia cabo-verdiana é sabor com histórias”, diz Ana Baessa

Acontece hoje, 3, a partir das 15 horas, o terceiro dia da Semana Internacional da Gastronomia Cabo-Verdiana. Ontem, 2, no âmbito do evento, três especialistas classificaram a gastronomia tradicional cabo-verdiana como expressão fundamental do património cultural do país, durante uma conferencia promovida pelo Instituto do Património Cultural, subordinado ao tema “Gastronomia Tradicional Cabo-Verdiana: das origens aos novos sabores”.

A Presidente do Instituto do Património Cultural, Ana Baessa, deu início à conferência, afirmando que a gastronomia cabo-verdiana representa sabores com histórias que surgiram no contexto do povoamento de Cabo Verde. “Não vamos falar de comida, vamos falar da nossa identidade cultural, da forma como nós trabalhamos os ingredientes e toda a vivência associada”, afirmou.

Fusão de duas dietas distintas, África/Europa

Os conferencistas Nereida Pereira, Isildo Gomes e Arlindo Mendes destacaram o papel da gastronomia nacional na transmissão de sabores essenciais para a identidade cultural e preservação da memória coletiva. O debate decorreu à volta de três aspetos importantes da evolução da gastrostomia nacional, desde a importância das primeiras plantas introduzidas nas ilhas, da fusão das duas cultural e consequentemente da sua alimentação, à mudança das tradições e da cultura cabo-verdiana ao longo dos tempos.

A arqueóloga Nereida Pereira explica que Cabo Verde foi habitado por duas populações, europeia e africana, cada uma com regimes alimentares distintos. Segundo a especialista, a dieta africana baseava-se em produtos de caça, peixe, tubérculos e outros derivados, com o comer a assumir um carácter quase de ritual, enquanto a dieta europeia era mediterrânica, composta essencialmente por pão, vinho, azeite, cereais, legumes, frutos secos e carne.

“Por trás de cada prato, existe a cultura e a identidade de cada pessoa que o confeciona. Com o avanço da colonização, deu-se a fusão destas duas dietas incentivada por fatores socioeconómicos”, explicou Nereida Pereira, referindo que os colonos importavam géneros alimentícios da costa da Guiné, como o milho africano e o arroz, enquanto os produtos mediterrânicos chegavam da Europa, através da navegação marítima.

Contribuição das plantas na gastronomia cabo-verdiana

Segundo o investigador e biólogo, Isildo Gomes as plantas foram primeiramente introduzidas para garantir a sobrevivência dos povoadores e, mais tarde, para fornecer mantimentos aos navios americanos e apoiar o comércio. “Cabo Verde oferecia condições arquipelágicas excelentes. Por isso, na ilha de Santiago, a primeira ilha a ser povoada, tem várias frutas de Portugal”, referiu.

Mudança dos hábitos culturais

O antropólogo Arlindo Mendes reflete sobre o desaparecimento de refeições fúnebres tradicionais devido ao surgimento de novas tendências e novos tipos de comida servida durante a cerimónia fúnebre. Mendes acredita que a mudança tem sido uma realidade em todos os aspetos, principalmente a nível cultural e social, frutos da aculturação, contudo, defende que é necessário que os investigadores trabalhem no sentido de recuperar a memória, sob pena do seu desaparecimento completo.

De acordo com o especialista, nos últimos tempos esta prática tem sofrido alterações, e com novas opções de alimentos que, a seu ver, não tem nada a ver com a tradição. “Atualmente, já se serve bolo, pastéis, banana, cuscuz, cachupa guisada, whisky, cerveja, que outrora não existiam. Fundamentalmente, noutros tempos, era feijão, xerém, carne de porco e carne de capado. Não se utiliza peixe, nem doce, nem leite, esses produtos são interditos nas refeições funerárias”, explicou.

“Toda a cultura evolui, todas as tradições também evoluem, é muito interessante saber o que permanece e porque permanece. Quando falamos de pratos, também falamos da nossa identidade”, conclui, Antonieta Lopes, moderadora da conferência.

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