Quinta-feira, 03 Julho 2025

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“Rêgo, Transa Bo Caminho de Volta” — Uma viagem às raízes pela arte de Evy Amado

A Sala do Munícipe da Câmara Municipal da Praia acolhe até hoje, 30, a exposição de pintura “Rêgo, Transa Bo Caminho de Volta”, de Evy Amado. É uma mostra que presta homenagem às mulheres africanas, à ancestralidade das tranças e à cultura capilar africana, ao mesmo tempo que propõe uma crítica ao excesso de consumo visual no mundo digital.

A exposição, composta por oito quadros, apresenta figuras humanas pinceladas sem olhos, num gesto intencional que, diz Evy Amado, pretende provocar uma reflexão sobre o excesso de imagens que se consome nas redes sociais e a superficialidade com que se observa o mundo.

“Hoje em dia, com a inteligência artificial, o 4G, o 5G… nunca estivemos tão rodeados de imagens. No entanto, sinto que vemos muito e observamos pouco. É uma crítica à velocidade do consumo visual. As pessoas não param para ver, para ouvir ou sentir. Esta exposição é também um convite à pausa”, explica a artista em conversa com nosso jornal.

Questionada sobre a escolha das tranças africanas como tema central da exposição, Evy recorda o impacto das oficinas de trança em que participou durante os seus estudos no Brasil, nomeadamente nas atividades da Semana Cultural Africana.

“Era uma prática comum nas escolas, como forma de falar com as crianças sobre a diversidade do cabelo. A trança esteve sempre presente na minha vida. Foi aí que percebi que tinha uma ligação emocional forte com ela. Leva-me a um lugar feliz da infância”, conta Evy. 

Esse resgate emocional e cultural levou a artista a transformar a trança em arte visual: “Quando decidi seguir o caminho das artes plásticas, percebi que tinha de trabalhar com algo que tivesse significado para mim. A trança é essa ligação com as minhas memórias, com as oficinas, com as vivências. É também uma forma de partilhar isso com outras pessoas.”

O nome da mostra “Rêgo, Transa Bo Caminho de Volta” carrega um duplo sentido, entre o físico e o simbólico. “O ‘rêgo’ é uma trança que marcou a minha vida, muito usada pelas crianças em Cabo Verde. Mas também representa um caminho de regresso às origens. Foi através do cabelo, do lidar com o meu cabelo, que voltei a conectar-me com a minha identidade”, explica a artista plástica. 

Para Evy Amado, as tranças são mais do que estética: “O rêgo não começou comigo, nem com a minha mãe. É uma trança ancestral, anterior até a Cristo. Faz parte da história de muitos povos africanos. É passado de geração em geração e tem uma importância simbólica enorme.”

A exposição, integrada nas comemorações dos 50 anos da Independência de Cabo Verde, presta também homenagem à mulher africana e ao seu papel na construção identitária e histórica.

“É uma celebração das mulheres que vieram antes de nós. As que resistiram, que criaram, que educaram. É também uma forma de destacar a força das mulheres cabo-verdianas e africanas no processo de afirmação cultural e na luta pela independência”, sublinhou.

A exposição estará patente até esta segunda-feira, 30 de junho, e pode ser visitada gratuitamente na Sala do Munícipe da Câmara Municipal da Praia.

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