Terça-feira, 02 Dezembro 2025

Grande Entrevista

“Queremos que o nosso município saia do último lugar entre os municípios de Cabo Verde” – Manuel Teixeira

O concelho de Santa Catarina do Fogo está a celebrar este mês 20 anos de criação. Em entrevista ao Voz do Archipelago, o presidente da Câmara Municipal deste concelho, Manuel Fernandes Teixeira, faz balanço do seu primeiro ano de mandato (11 meses depois de tomar posse). Admite dificuldades financeiras, que diz ter herdado do anterior executivo, mas, também, destaca investimentos realizados, apelando ao contributo de todos para que a região se torne “competitiva” e deixe de ocupar o último lugar do índice de desenvolvimento local.

Por: Renibly Monteiro

Voz do Archipelago (VA) – O município de Santa Catarina comemora 20 anos de existência. Como estão a decorrer as festividades?

Manuel Teixeira (MT) – É uma data extremamente especial. Preparámos as festividades desde o início do ano, com várias inovações e um conjunto diversificado de eventos, que começaram no dia 15, com a Feira de Profissões. Realizou-se várias iniciativas no âmbito do desporto (atletismo, jogos de cartas, bisca, corridas e futebol) e, neste momento, estamos no segundo dia das festividades culturais. Este sábado, 22, encerramos o segundo dia da Feira Agropecuária e estamos também no segundo dia do Festival de Música. Ontem iniciámos com a Noite Branca, que foi extremamente positiva, e hoje perspetivamos uma segunda noite ainda melhor.

VA – Que impacto económico e social esta festa representa para o município?

MT – O impacto económico das festividades é extremamente positivo porque apresenta oportunidades tanto para os negócios do município como para restaurantes, hotéis e empreendedores, e também para o setor informal faturar e obter algum retorno financeiro. Podemos destacar como maior dinamizador destas atividades uma inovação que introduzimos, um espaço bem arejado, com uma área VIP e maior concentração de barracas,15 no total. Todas tiveram grande afluência, participação e retorno financeiro.

VA – Em termos de segurança e trânsito, que medidas foram adotadas para garantir que tudo corra com tranquilidade?

MT – A questão da segurança foi uma prioridade desde o primeiro momento. Estivemos em várias reuniões com o comandante da esquadra da Polícia Nacional e também em contato com o comandante regional. Contratámos uma empresa de segurança privada e fizemos ações pedagógicas e preventivas junto dos munícipes. Ontem tivemos a Noite Branca e não tive conhecimento de nenhum incidente grave, praticamente zero incidentes. Isso demonstra o bom trabalho da Polícia Nacional, da Câmara Municipal, dos munícipes e da organização. Em termos de trânsito, também houve melhorias. Neste mandato reativámos uma via próxima que estava praticamente abandonada há mais de oito anos. Recuperámos essa via pensando na dinâmica, na segurança e na prevenção de problemas de transportes. Foi importante porque, além de dinamizar a chegada e saída de transportes, a Polícia conseguiu que tudo decorresse sem congestionamentos, acidentes ou incidentes. Estamos satisfeitos com todos os resultados obtidos em matéria de segurança.

VA – No dia 2 de dezembro completa um ano de mandato. Que balanço faz do seu primeiro ano à frente da Câmara Municipal de Santa Catarina?

MT – Durante este primeiro mandato deparei-me com algumas dificuldades, mas conseguimos realizar ações na área social, investindo muito em evacuações por doença, apoio com casas de banho (vamos entregar agora quatro casas de banho construídas de raiz para famílias mais vulneráveis) e intervenções em tetos de habitações. Concluímos o projeto da Casa dos Pescadores, com eletrificação 100% renovável. Este domingo, 23, fizemos a reabertura da nossa delegação na região de Chã das Caldeiras e até o final do ano teremos duas zonas com praça digitalizada, com cobertura da Starlink. Temos trabalhado muito com o Fundo de Turismo e o Fundo do Ambiente, nomeadamente na desativação completa da nossa lixeira, que fica à entrada do município, na cidade de Cova Figueira, e também no reforço da área de saneamento. Este primeiro ano foi, de fato, extremamente complicado em termos de recursos, pois herdámos uma câmara com muitas dificuldades financeiras, com juros elevados e processos pendentes desde 2019, que temos estado a tentar resolver para poder projetar uma melhor estratégia para 2026, já aprovada pela Assembleia Municipal, e ter resultados melhores do que este primeiro ano de mandato.

VA – Quais as principais realizações alcançadas pela equipa camarária neste primeiro ano?

MT – As realizações centram-se, primeiramente, na área social. Temos um município extremamente rural onde, além da dificuldade financeira, tivemos que fazer várias manobras para conseguir terminar algumas obras já em construção. Destaco a conclusão da casa dos pescadores, uma obra que encontrámos financiada a 50%. Procurámos novo financiamento, juntamente com fundos da câmara municipal, para concluir esta obra, que inaugurámos no dia 24 de novembro. Temos também a praça de Fonte Aleixo, financiada 100% pelo Fundo do Ambiente, e que, quando entrámos, estava na primeira fase de construção, já concluímos a segunda fase. A obra está concluída e tínhamos previsto a inauguração para o dia 24, mas, infelizmente, não vamos fazer isso porque faltam equipamentos do parque infantil devido a problemas com o transporte para a ilha do Fogo, ainda não chegaram da cidade da Praia. É uma praça que vamos digitalizar, que também terá Starlink, por isso queremos fazer a inauguração em grande. Vamos conseguir penetrar diretamente em Chã das Caldeiras para estarmos mais próximos com a abertura da nova delegação. Elaborámos um projeto, através de um contrato-programa com o PNUD, orçado em 15 milhões de escudos, que nos permitirá eletrificar a Casa dos Pescadores. Os pescadores terão acesso a energia e internet Starlink numa zona onde a rede é extremamente complicada. Investimos também, este ano, através do Ministério da Família, em projetos que beneficiaram cerca de 30 famílias.

VA – O município foi afetado este ano por um incêndio. Que medidas foram tomadas para debelar as consequências negativas?

MT – Ajudámos as pessoas na recuperação das áreas degradadas, mas ainda estamos à espera do desbloqueio do valor aprovado pelo Governo desde julho deste ano. Até agora não recebemos o fundo de auxílio para prosseguir com os projetos que temos elencados para combater as consequências do incêndio de maio de 2025.

VA – Como tem sido o relacionamento entre a Câmara Municipal e o Governo?

MT – Da parte da Câmara Municipal de Santa Catarina, a relação com o Governo é institucional e de respeito, como deve existir, independentemente de visões ou partidos opostos, e fazemos o máximo para obter proveito para o município nesse relacionamento. Tudo o que fazemos, pedimos ou exigimos ao Governo é para benefício do nosso município.

VA – Considera que esta relação podia ser melhorada?

MT – Acredito que alguns processos deveriam ser menos burocráticos. Os municípios passam por situações extremamente complicadas e o Governo deve estar sempre pronto para agir rapidamente. O município sofreu um incêndio, em maio de 2025, fez todo o trabalho necessário, mas já se passaram quase sete meses, e mesmo com decisão tomada, ainda estamos à espera de receber o apoio do Governo. Acho que estes processos, à semelhança do que aconteceu nos últimos dias em Tarrafal, São Miguel e Santa Cruz, na ilha de Santiago, devem ter respostas rápidas, independentemente da situação ou de quem está a governar, para colmatar o mais rapidamente possível os problemas que surgem de um momento para o outro. Até agora não sarámos esta ferida porque as consequências do incêndio foram agravadas pelo mau ano agrícola, temos mais pedidos, mais agricultores e criadores de gado em situação extremamente vulnerável. A Câmara Municipal de Santa Catarina sozinha não consegue dar resposta a todos, mas, se tivesse recebido atenção atempada do Governo, com certeza esses munícipes já teriam os seus problemas resolvidos.

VA – Quais são as prioridades estratégicas do município para 2026?

MT – Para 2026 temos algumas estratégias específicas. Uma delas é a resolução de pendências financeiras e processos que impedem o município de ter a sua situação resolvida de uma vez por todas, bem como fazer investimentos nas áreas fundamentais e cruciais: agricultura, pesca, educação, pecuária, turismo, entre outras. Aprovámos que, no próximo ano, iremos recorrer à banca para fazer um novo empréstimo, a fim de resolvermos essas pendências e, com parte desse valor, fazer investimentos em várias áreas, incluindo desporto e saneamento. Temos também que trabalhar muito com o setor privado para atrair investidores. Com esta missão estamos a trabalhar fortemente e já começámos a desenhar, por exemplo, a implementação de um posto de combustível, somos o único município de Cabo Verde que ainda não tem um. Acredito que estas intervenções trarão grandes benefícios para o município e facilitarão a vida de todos os moradores. Na área da educação existe um projeto de cooperação com o Luxemburgo de continuação, em 2026, da reabilitação de jardins e escolas.

VA – Gostaria de deixar uma mensagem aos munícipes, especialmente neste período de festa?

MT – Queria deixar uma mensagem de esperança. Estamos a celebrar os 20 anos do nosso município sob o lema “Duas décadas de resiliência, sonho e esperança”, pois são duas décadas de um processo de desenvolvimento de um município que tem vários desafios. Enquanto presidente da câmara municipal, considero que este desenvolvimento não é isolado, não é responsabilidade apenas dos órgãos municipais, é um processo de todos: das entidades civis, do Governo, das entidades locais, dos munícipes e também da nossa comunidade emigrada, sobretudo a que está nos Estados Unidos da América. Acredito que o esforço que tem sido feito ao longo de vários anos, e que continua a ser feito, trará grandes ganhos ao município. É um município que está em ascensão, e que, daqui a cinco, dez, 15 ou 20 anos, alcançará um bom nível de desenvolvimento. A nossa equipa está todos os dias a trabalhar para que todo o município saia a ganhar. Independentemente das visões políticas, questões religiosas ou posições na sociedade, estamos a trabalhar firmemente para devolver um município muito mais equilibrado, inclusivo e participativo. Estamos de braços abertos para todos os que queiram vir a Santa Catarina, trazendo as suas contribuições. Queremos que o nosso município saia do último lugar entre os municípios de Cabo Verde e passe também a ser competitivo, idêntico a vários outros municípios cabo-verdianos. Todos nós, a nossa equipa e toda a comunidade, iremos ganhar quando houver essa predisposição em contribuir com o município. Que o final das comemorações dos 20 anos confirme o que sempre dissemos: Santa Catarina em primeiro lugar e, juntos, sempre venceremos.

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