Nos últimos anos, a antiga Electra — que durante décadas concentrou as funções de produção, transporte e distribuição — deu lugar a três novas entidades: a EPEC, dedicada à produção térmica de eletricidade; a EDEC, encarregue da distribuição e comercialização, que hoje aparece nas faturas dos consumidores; e a ONSEC, operador nacional do sistema, responsável pela gestão da rede de transporte e pela estabilidade do sistema. Esta reestruturação foi apresentada como um passo decisivo para a modernização: maior transparência, separação de responsabilidades e abertura ao investimento privado. A meta anunciada é clara: privatizar parte da EPEC e da EDEC, atrair parceiros estratégicos, reforçar a capacidade de produção e, sobretudo, dar mais confiança ao sistema. No entanto, a experiência dos últimos meses mostra que a população ainda não colheu os frutos dessa mudança. Apagões frequentes em Santiago e no Maio, geradores avariados que aguardam peças do exterior, e custos elevados que colocam Cabo Verde entre os países da África Subsariana com eletricidade mais cara são sinais de que, apesar das reformas institucionais, a realidade permanece difícil.
Não estamos perante uma simples falha técnica. O que se evidencia é a ausência de planeamento consistente, a fragilidade da capacidade de gestão e, sobretudo, a falta de compromisso em transformar reformas em resultados. De pouco serve reformar empresas e mudar nomes nas faturas se, na prática, as famílias continuam a ver os seus alimentos estragarem nos congeladores, se as pequenas empresas são obrigadas a paralisar atividades e perder clientes, ou se os estudantes veem interrompido o tempo que deveria ser dedicado ao estudo e ao futuro.
O impacto ultrapassa a questão energética: é social, porque afeta diretamente a qualidade de vida das pessoas; é económico, porque trava a produtividade e desmotiva o investimento; e é cultural, porque limita o acesso à informação, ao lazer e ao conhecimento. Em suma, a crise energética mina as bases do desenvolvimento e compromete a confiança da população no rumo do país.
É necessário dar um salto qualitativo. Isso implica:
Se estas medidas não forem assumidas com clareza e firmeza, corremos o risco de regredir: mais reformas no papel, mais mudanças de siglas, mas sem luz estável nas casas. O futuro energético de Cabo Verde não pode ficar preso a remendos, nem a soluções provisórias. O desafio é grande, mas também é uma oportunidade: colocar o país na linha da frente da transição energética em África, transformando sol e vento em motores de desenvolvimento. Isso exige liderança, visão de longo prazo e compromisso absoluto com o bem-estar dos cidadãos.
Mais do que nunca, é tempo de transformar reformas em resultados. A energia elétrica não é apenas uma mercadoria: é a base da dignidade, da modernidade e da esperança. Cabo Verde merece um setor energético que ilumine não só as suas cidades, mas também o futuro das suas gerações.
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