Quinta-feira, 16 Outubro 2025

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Microfinanças em Cabo Verde: Crescimento da carteira de crédito contrasta com queda nos resultados

O setor das microfinanças em Cabo Verde registou em 2024 um crescimento de 6% no total de ativos, atingindo cerca de 1,47 mil milhões de escudos, segundo o Relatório Anual do Banco de Cabo Verde. No entanto, os resultados líquidos caíram 25% face ao ano anterior, refletindo o aumento dos custos operacionais e a deterioração da qualidade da carteira de crédito. O relatório, que abrange cinco das sete instituições de microfinanças registadas no país – todas cooperativas e mutualidades enquadradas na categoria B –, evidencia um setor em expansão mas confrontado com desafios estruturais persistentes.

A carteira de crédito ativa cresceu 11,7%, ultrapassando os 947 milhões de escudos, com mais de 11 mil clientes ativos, um aumento de 8,9% face a 2023. O documento refere que “três instituições concentram, em conjunto, cerca de 85 por cento da carteira de crédito concedido”, destacando a concentração do mercado em poucas entidades de grande porte.

O microcrédito mantém-se como o produto predominante. “O crédito destinado aos setores do comércio e dos serviços representou 41,17 por cento da carteira bruta total”, revela o relatório, evidenciando onde se concentra o financiamento. A reabilitação habitacional absorve 25% do crédito concedido, demonstrando “a elevada procura de financiamento para melhorias nas condições de habitação”. Contudo, a carteira vencida disparou 54%, elevando o rácio PAR 30 de 8,1% para 8,6%. O Banco de Cabo Verde sublinha que “a elevação da carteira em risco (PAR 30) em determinadas instituições” está “associada, em grande medida, a fragilidades nos processos de análise de crédito e de mitigação de riscos”.

Mulheres continuam a ser principais beneficiárias

“As mulheres continuam a figurar como principais beneficiárias, representando em torno de 59 por cento dos créditos concedidos em 2024”, destaca o relatório. Esta predominância confirma “a continuidade de uma tendência histórica do setor de microfinanças em Cabo Verde, onde as mulheres têm assumido um papel central no acesso e utilização do microcrédito”.

O público-alvo mantém-se “predominantemente, a população de baixos rendimentos, composta por indivíduos com perfil empreendedor, envolvidos em atividades geradoras de rendimento”, incluindo mães solteiras, vendedoras ambulantes, microempresárias e jovens à procura do primeiro emprego.

Custos operacionais pressionam rentabilidade

Os custos operacionais aumentaram 11%, totalizando 246 milhões de escudos. O relatório aponta que “as despesas com pessoal constituem a principal componente dos gastos operacionais, representando cerca de 62 por cento do total”. Este aumento, aliado à redução de 20% na margem complementar, contribuiu para a queda nos resultados líquidos. Os indicadores de rentabilidade refletem esta pressão: o ROE caiu de 11% para 7,5%, enquanto o ROA desceu de 7% para 4,7%.

Fragilidades estruturais persistem

O documento é claro ao afirmar que “as vulnerabilidades já identificadas em anos anteriores não só permanecem presentes como continuam a condicionar o desenvolvimento sustentável do setor de microfinanças em Cabo Verde”. Entre as principais fragilidades, o relatório identifica a “fragilidade dos sistemas de governança e de controlo interno”, sublinhando que “subsiste a necessidade de reforçar a capacitação de membros dos órgãos sociais e das equipas de gestão”.

Adicionalmente, refere “limitações na qualidade da informação financeira reportada”, que “dificulta a consolidação e a análise rigorosa do desempenho agregado do setor”, e destaca o problema da “baixa literacia financeira dos clientes”, fator que “continua a condicionar a utilização adequada dos serviços financeiros”.

O relatório alerta ainda para os “efeitos adversos das alterações climáticas, designadamente a ocorrência mais frequente de secas prolongadas”, que têm “impacto direto sobre clientes do setor agrícola e rural, reduzindo a sua capacidade de geração de rendimentos”.

Digitalização como oportunidade estratégica

Apesar dos desafios, o Banco de Cabo Verde identifica oportunidades de modernização. “A digitalização continua a apresentar-se como uma oportunidade estratégica para as instituições de microfinanças em Cabo Verde, permitindo maior eficiência operacional e expansão do acesso a serviços financeiros”, refere o documento.

O relatório defende que “a implementação de soluções digitais nos produtos e serviços, oferece às IMF uma oportunidade de modernizar operações, ampliar a cobertura e melhorar a experiência dos clientes”, apontando soluções como carteiras digitais, empréstimos online e plataformas de educação financeira.

O setor de microfinanças representa 0,53% do PIB cabo-verdiano e 0,39% dos ativos do sistema financeiro nacional. Em 2024, o Banco de Cabo Verde reforçou a supervisão através de inspeções in loco, atualização dos modelos de reporte e integração das instituições na Central de Registo de Crédito, procurando fortalecer a transparência e solidez do setor.Tentar novamenteO Claude pode cometer erros. Confira sempre as respostas.

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