Quinta-feira, 16 Outubro 2025

A análise de Alex Sgreccia

O julgamento histórico

O julgamento, que pela primeira vez no Brasil condenou um ex-presidente e militares de alta patente e no qual os juízes da Suprema Corte não se curvaram às pressões do governo Trump, teve ampla repercussão internacional. Foi destaque em jornais e revistas no mundo na sexta-feira, dia 12 de setembro. A revista britânica The Economist reforçou a ideia de ter sido um julgamento histórico. Matéria publicada pelo americano Wall Street Journal afirma: “Para os críticos de Bolsonaro, o julgamento é uma vitória para a jovem democracia do país e um acerto de contas com seu passado autoritário. É a prova, dizem eles, de que o país pode responsabilizar seus líderes, oferecendo um exemplo ao mundo – e especificamente aos EUA – de que nenhum presidente está acima da lei.” (Daniel Gallas, BBC News Brasil, 12/09).

O julgamento dos réus acusados por tentativa de golpe de Estado e de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, entre outros crimes, terminou, como previsto, no dia 12 de setembro. Foi conduzido ao longo de dez dias com serenidade pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal como etapa final do processo que respeitou todos os procedimentos previstos no regime democrático brasileiro.

O julgamento transcorreu sob a ameaça de novas retaliações dos Estados Unidos, que já vinham impondo sanções a membros do STF. Ocorreu sob ecos conflitantes das manifestações de 7 de setembro, os bolsonaristas reivindicando a anistia aos golpistas e os movimentos populares expressando a vontade da maioria do povo brasileiro contra a anistia, em defesa da democracia e da soberania brasileira.

Na semana anterior ao julgamento, membros do Supremo reafirmaram a soberania do órgão e a defesa das instituições democráticas brasileiras, num sinal claro de que não se curvariam às pressões.  Segundo o ministro Gilmar Mendes, a democracia brasileira “sabe militar por sua própria conservação” e o plano golpista violento foi “urdido por figuras proeminentes do governo e por militares do alto escalão” e, “ao que tudo indica, com o beneplácito do presidente da República [Bolsonaro]”. “O STF não se curvou à ditadura militar e não aceitará submissão, diante de pressões internas e externas”, disse Mendes. (Cezar Feitoza, FSP, 03/09).

O procurador-geral da República, Paulo Gonet, disse no primeiro dia do julgamento que um Estado deve reprimir tentativas de golpe para evitar um aumento de ímpetos autoritários. Os advogados de defesa fizeram malabarismo para tentar inocentar os réus e evitar a condenção, questões abordadas exaustivamente pela mídia.

O ex-presidente Jair Bolsonaro foi condenado a 27 anos e três meses de prisão por todos os crimes dos quais foi acusado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) na trama golpista: golpe de Estado, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, organização criminosa armada, deterioração de patrimônio tombado e dano qualificado. O mesmo entendimento foi seguido pela maioria em relação à condenação dos outros réus: Alexandre Ramagem, ex-diretor da Abin (16 anos);_ Mauro Cid, ex-ajudante de ordens (2 anos ); Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil (26 anos); Anderson Torres, ex-ministro da Justiça (24 anos); Augusto Heleno, ex-ministro do GSI (21 anos); Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa (19 anos); e Almir Garnier, ex-comandante da Marinha ( 24 anos).

voto decisivo aconteceu na sessão de quinta-feira (11), com a ministra Cármen Lúcia. A magistrada acompanhou o relator Alexandre de Moraes, assim como os ministros Flávio Dino e Cristiano Zanin. Já o ministro Luiz Fux, em voto de 13 horas na quarta-feira (10), votou por condenar Braga Netto e Mauro Cid apenas por tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. O magistrado defendeu absolver os demais réus. Foi uma contradição em termos. Foi também contraditório com seu próprio posicionamento por ocasião do julgamento dos golpistas que tomaram Brasília de assalto   no dia 8 de janeiro de 2023.  Apesar das pesadas penas imputadas aos réus, o voto de Fux a favor da absolvição de Bolsonaro foi o mote esperado pela direita radical para dar continuidade à campanha pela anistia.

O julgamento foi capa da prestigiada revista britânica The Economist, sob o título “O que o Brasil pode ensinar à América”.  A reportagem afirma que o Brasil “dá um exemplo de maturidade democrática aos Estados Unidos, “Pelo menos temporariamente, o papel do adulto democrático do hemisfério ocidental se deslocou para o sul”, afirmou a reportagem. (The Economist, ago-set). 

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