Terça-feira, 02 Dezembro 2025

A análise de Alex Sgreccia

COP 30: Mudança de foco, sem promessas pomposas

A COP30, realizada em Belém do Pará, de 10 a 21 de novembro, não chegou a ser a COP da mudança, como anunciou Lula, presidente do Brasil, nem a conferência esvaziada, sem a presença dos Estados Unidos, como previa grande parte da mídia internacional. Participaram da COP 195 países e cerca de 42 mil pessoas, tornando-se o maior evento das Nações Unidas realizado até o momento. Aconteceu simbolicamente no coração da Amazônia, despertou novamente a atenção do mundo para a urgência de políticas efetivas para evitar que o aquecimento global se torne irreversível, risco que desponta no horizonte de uma forma perturbadora. O jornal britânico Financial Times talvez tenha feito uma das avaliações mais precisas do significado político da COP30 ao afirmar: “O evento marcou uma mudança de foco, deixando de lado promessas pomposas e passando a abordar as complexidades do mundo real na redução das emissões. (...) Dezenas de governos procuraram abordar essa lacuna convocando Belém para um roteiro de transição para combustíveis fósseis, uma iniciativa que levou os participantes a explicitar, com clareza e objetividade, os muitos obstáculos que atualmente bloqueiam essa transição.”

O almejado Mapa do Caminho, com metas, indicadores e recursos compartilhados para se fazer a transição do modelo atual de desenvolvimento baseado no uso de combustíveis fósseis para um padrão de desenvolvimento sustentável, com base em energia limpa, não chegou a ser incorporado nas resoluções finais da COP30 por pressão dos países petrolíferos liderados pela Arábia Saudita, que serviu também de porta-voz dos interesses norte-americanos. O documento Mutirão Global: Unindo a humanidade em uma mobilização global contra a mudança do clima” não cita os combustíveis fósseis, mas cria estruturas que ampliam a agenda de cooperação, organizam debates e inclui a meta de triplicar o financiamento para adaptação até 2035.

O presidente da COP30 foi aplaudido após afirmar que o Mapa do Caminho para o fim do uso dos combustíveis fósseis não será abandonado. “Eu prometo que vou tentar não desapontar vocês. Nós precisamos de mapas para que possamos ultrapassar a dependência dos fósseis de forma ordenada e justa. Eu vou criar dois mapas: um para reverter o desmatamento e fazer transição para longe dos fósseis”, anunciou o embaixador brasileiro André Correia do Lago.  A ministra brasileira do Meio Ambiente, Marina Silva, ao comparar os resultados da COP30 com as ambições da Rio-93, cúpula do clima que deu origem às COPs, chegou a afirmar que os negociadores de três décadas atrás “sonhavam com muito mais resultados” e que esperavam uma virada ambiental mais rápida baseada na ciência e na urgência climática (G1, 22/11).

Outras decisões importantes foram tomadas, para além da Decisão do Mutirão, entre elas: Programa de Transição Justa, que cria um mecanismo formal para apoiar países em políticas de transição justa — incluindo cooperação técnica, geração de empregos, proteção social e inclusão de trabalhadores afetados pela mudança do modelo energético; Fundo de Adaptação, que amplia o teto de projetos (de US$ 10 milhões para até US$ 25 milhões por país) e reconhece a falta de recursos para atingir a meta anual de US$ 300 milhões. O texto reforça a urgência de ampliar o apoio financeiro à adaptação; Objetivo Global de Adaptação (GGA), conjunto de indicadores globais de adaptação, criando uma estrutura inédita para medir progresso, vulnerabilidades e ações de resiliência de forma padronizada entre os países. (G1, 22/11).

Segundo analistas, a ausência dos Estados Unidos na COP30 abriu espaço para Europa, Brasil, China e países do Sul Global impulsionarem soluções que priorizam padrões abertos e acesso a tecnologias verdes essenciais, num contexto de guerra tarifária e acirramento das disputas comerciais que afetam diretamente tecnologias de descarbonização.  

Ainda de acordo com avaliações publicadas na mídia, o Brasil esperava maior coordenação com o BRIC para avançar padrões abertos e cooperação tecnológica, mas o grupo se mostrou menos coeso do que o previsto, sobretudo nos temas energéticos. A China contou com a segunda maior delegação da COP 30 depois do Brasil. O país asiático atuou de forma pragmática em financiamento e adaptação, mas sem se envolver diretamente na agenda digital proposta pelo Brasil. Já Rússia e Arábia Saudita lideraram a resistência ao Mapa do Caminho obrigatório dos fósseis, reforçando o bloco produtor e limitando a ambição coletiva.

A COP30, realizada no Brasil, poderia ter ido além, como todas as anteriores. Ainda assim, deixou encaminhamentos políticos relevantes e estruturou debates que serão decisivos nas próximas conferências, “consolidando Belém como um ponto de inflexão na agenda de implementação do Acordo de Paris”.  

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