A ligação foi realizada em 21 de novembro. Segundo informações divulgadas pela Reuters, Trump rejeitou a maioria dos pedidos feitos por Nicolas Maduro para deixar o país: anistia total para ele e sua família; a suspensão das sanções para mais de cem funcionários do regime venezuelano, muitos deles acusados pelos EUA de abusos contra os direitos humanos, tráfico de drogas ou corrupção; governo interino liderado por sua vice-presidente Delcy Rodrigues, antes de convocar novas eleições. (Reuters, 01/12).
A investida contra Maduro mostra que Trump considera os países latino-americanos como extensão do território dos Estados Unidos, como seu “quintal”, para usar uma expressão que parecia estar fora de moda. O combate ao narco-terrorismo e a ameaça que representa à segurança norte-americana são apenas o mote, a justificativa para recuperar o domínio sobre a região, neutralizar a crescente influência chinesa, manter governos de direita submissos a Washington e assumir o controle de vastos recursos naturais, como o petróleo venezuelano e minerais raros brasileiros.
Isso ficou claro no documento Estratégia de Segurança Nacional recém-divulgado sobre a nova ordem internacional que Trump busca construir. No que diz respeito à América Latina, o plano prevê o uso da força e a presença militar na região para enfrentar ameaças ao Hemisfério, o fim da migração em massa para os EUA e o estabelecimento da doutrina da paz, “através do uso da força”.
Derrubar Maduro virou questão de honra para Trump e o sucesso da empreitada poderá indicar o caminho para a investida contra a Colômbia. O Chile, onde o candidato da direita usa o medo e a segurança pública como motes de campanha, e o Peru, onde o virtual candidato da direita, o prefeito de Lima, não nega suas relações com o MAGA (Make America Great Again), são os laboratórios onde o processo eleitoral está sendo usado para assegurar a expansão da área de influência do império norte-americano no continente. Deu certo na Bolívia, onde a divisão da esquerda favoreceu a chegada da direita ao poder. Processo semelhante ocorreu no Equador.
El Salvador, onde o governo Bukele tem exercido uma brutal repressão às facções criminosas, tornou-se uma referência para e extrema-direita dada sua proximidade e cooperação com o governo Trump, particularmente na ação contra imigrantes. No Paraguai, país onde a direita prevalece há décadas em estreita relações com os EUA, já está em andamento a instalação de uma base militar norte-americana. Just in case, diriam.
Na Argentina, Milei é o parceiro incondicional, a quem Trump tem socorrido com bilhões de dólares para segurar a combalida economia. No Uruguai, onde tem prevalecido a alternância de poder entre esquerda e direita, o atual governo vê com reservada simpatia a investida de Trump no continente.
México e Brasil são “ossos duros de roer” nessa estratégia e requerem uma abordagem mais complexa. A presidente do México, Claudia Sheinbaum, conta com alto índice de aprovação, vem ampliando as políticas sociais do governo anterior e aprofundando as reformas para fortalecer as instituições democráticas. Tem resistido com altivez às investidas de Trump, preservando a soberania nacional. O presidente Lula tem construído uma respeitada trajetória internacional como liderança do Sul Global, conseguiu reverter o tarifaço imposto por Trump, tem a China como principal parceiro comercial, ampliou relações comerciais com a Ásia e está prestes a fechar o acordo comercial do Mercosul com a Europa, o que seguramente impactará as relações de poder no tabuleiro geopolítico. Antecipa-se ao jogo do presidente norte-americano com quem busca uma aproximação e de quem reivindica apoio para combater o crime organizado. E o faz em nome da soberania nacional.